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O último goleador português 'leonino'

Por sporting
09 maio, 2013

Cadete representou o Sporting durante 10 anos, onde foi «capitão». Nesta entrevista, recorda momentos marcantes de «leão» ao peito.

Jorge Cadete representou o Sporting durante 10 anos, tendo sido o melhor marcador do campeonato nacional em 1992/93, com 18 golos, embora a sua temporada mais produtiva tenha sido a anterior, ao marcar 25 golos na prova. Formado no Sporting, estreou-se na equipa senior em 1987/88, num encontro com o MTK Budapeste, mas alinhou em apenas dois jogos do campeonato. Em 1988/89, foi emprestado ao Vitória de Setúbal, onde brilhou a grande altura, treinado por Manuel Fernandes, marcando 10 golos no campeonato e justificando o regresso a Alvalade. 1989/90 foi a época da sua afirmação no Sporting, tendo cumprido 29 jogos no campeonato nacional, dos quais 25 como titular. O antigo «capitão» do Sporting gostava de jogar com a camisola 11, porque esse era o número de Rui Jordão, o seu ídolo. No Vitória de Setúbal, usava o número 9, porque o 11 era de… Jordão. “Ter tido a possibilidade de treinar com ele no Sporting e de jogar ao seu lado no Vitória de Setúbal valeu por tudo! Tal como ter jogado com o Manuel Fernandes e com o Fernando Gomes. Enquanto extremo, aprendi muito com eles sobre como deve um ponta-de-lança movimentar-se e mais tarde apliquei esses ensinamentos. Muitas vezes nós vemos os extremos a cruzar para o avançado, mas não pode ser! Têm de centrar para um ponto onde sabem que o colega vai aparecer, sabendo que o adversário só reage depois da desmarcação do avançado”, explica. Ao longo de toda a carreira, o antigo avançado orgulha-se de ter chegado apenas uma vez atrasado a um treino. “Os jogadores faziam uma festa enorme no balneário quando isso acontecia, porque significava que entrava mais dinheiro para a caixa das multas... Nesse dia em que cheguei atrasado, o ambiente era de euforia. É que ainda por cima eu era o ‘capitão’ de equipa… Paguei a multa e fui treinar, mas só não cheguei a horas porque tive um acidente na A2, ao pé das actuais portagens de Setúbal, local que na altura tinha uma curva enorme. Liguei a uma pessoa, que me emprestou o carro e vim para o estádio, tendo chegado 11 minutos atrasado”, conta. Apesar de ter representado o Benfica durante cerca de um ano, Jorge Cadete sempre assumiu ser «leão» de coração, embora sem protagonismos. E confessa a vontade de servir o nosso Clube. “Não gosto de estar constantemente a aparecer e a dizer que sou sportinguista. Não preciso de andar com um cachecol do Sporting para mostrar que gosto do clube. Claro que tenho pena de nos últimos anos não ter tido oportunidade de trabalhar no Sporting. Ou melhor, de servir o Sporting, fazendo algo de útil”, confessa. Em tantos anos ao serviço dos «verdes e brancos», Cadete lamenta um episódio: “Com Carlos Queiroz, nas férias, passei de capitão e melhor marcador da equipa para não convocado. Mas nunca fui bater-lhe ao gabinete e perguntar-lhe porque não jogava”. Essa mágoa não se compara no entanto ao sofrimento que viveu em Dezembro de 1993, devido ao trágico acidente de viação sofrido por Cherbakov, depois do jantar de despedida de Bobby Robson. Como se sabe, o promissor futebolista ficou tetraplégico. “Fiquei muito afectado com o que lhe aconteceu. Lembro-me perfeitamente como tudo aconteceu. No final do jantar, ouvi o Cherbakov a convidar o Balakov para sair. Levantei-me e disse-lhes que ninguém ia sair, porque tínhamos um treinador novo [Carlos Queiroz] e um jogo muito importante com o Benfica poucos dias depois. O Balakov não saiu, ao contrário do Cherbakov. Às 5 da manhã, recebi um telefonema a relatar o que tinha acontecido e fui logo para o hospital. Um tio meu também esteve paraplégico, durante dez anos, até morrer, por isso ainda fiquei mais afectado”, diz. Os dias que se seguiram foram muito difíceis: “O Cherbakov era um jogador jovem, com imenso talento, que estava sozinho num país estrangeiro. Tínhamos imenso carinho por ele… Só quem fosse insensível é que não ficava marcado por esta situação infeliz”. Cadete sempre foi elogiado pelo espírito de sacrifício que demonstrou com a nossa camisola. Quem lá esteve, não mais esquecerá a célebre noite com o Celtic, em Alvalade, na segunda mão da segunda eliminatória da Taça UEFA de 1993/94, em que marcou os dois golos na vitória por 2-0, resultado que permitiu anular a desvantagem de 0-1 trazida da Escócia. “Igualo a eliminatória aos 18 minutos e aos 21 ou 22, faço uma microrrotura. Colocaram-me uma coxa elástica e aguentei até ao intervalo. Durante o descanso, fizeram-me massagens e disse ao Bobby Robson que só iria sair quando fizesse o 2-0. Deram-me uma injecção de Voltaren e ligaram-me a perna toda, bem apertada. Nos momentos em que tinha de ‘sprintar’, nem sentia a dor, mas quando corria mais devagar, era insuportável. Saí aos 75 minutos, substituído pelo Leal”, lembra, acrescentando: “No dia seguinte, fui fazer uma ecografia, que revelou 12 milímetros de microrrotura”. Jorge Cadete fez parte de grandes equipas do Sporting, que por um ou outro motivo passaram, por pouco, ao lado da glória. “Houve um grande erro, reconhecido pelo próprio presidente Sousa Cintra, que foi ter despedido o Bobby Robson depois da eliminação com o Casino Salzburgo [o Sporting seguia em segundo no campeonato, em igualdade pontual com o líder]", lamenta. "Muitas vezes, as arbitragens também nos eram muito prejudiciais. Posso citar um exemplo incrível, em 1990/91, quando me anularam um golo num jogo com o FC Porto, em Alvalade. O Vítor Baía saltou com o Aloísio, a bola sobrou para mim e eu faço o golo, sem qualquer toque nos adversários. Hoje em dia, as arbitragens são melhores, porque têm muita visibilidade, mas ainda há pouco tempo houve um árbitro que não conseguiu ver três grandes penalidades a favor do Sporting…”, sublinha. Quanto aos treinadores que o orientaram em Alvalade, destaca dois nomes: “Todos eles me marcaram, uns mais do que outros, mas aprendi muito e todos fizeram de mim mais jogador. Mas posso referir os nomes de Marinho Peres e Bobby Robson, duas referências como técnicos mas também como pessoas”. Jorge Cadete marcou muitos golos de belo efeito ao serviço do Sporting, mas não hesita em escolher o mais espectacular. “Foi um de calcanhar ao Beira-Mar, no Estádio Mário Duarte. Foi um movimento de instinto e por recurso. O Balakov centrou e eu faço-me ao lance de cabeça. A bola entretanto ‘raspou’ no ombro do Ribeiro [defesa do Beira-Mar] e volta para trás. Já estava balanceado e de calcanhar era a única maneira de tocar a bola para a baliza. Acabou por ser um golo de sorte, pois a bola poderia ter levado outra trajectória, mas foi feito com toda a intenção”, garante. Outro golo que recorda foi um chapéu, de cabeça, efectuado à entrada da grande área, na sequência de um cruzamento do defesa-direito Nélson. “Aconteceu porque o Nélson tinha o hábito de fingir que ia cruzar de pé direito e depois puxar para o pé esquerdo e, então sim, efectuar o centro. Desmarquei-me, depois voltei para trás e, como recurso, fiz o chapéu ao Lemajic [guarda-redes que depois viria a representar o Sporting]”, lembra. Por fim, a fechar o pódio de golos mais bonitos, aqui fica a descrição na primeira pessoa: “Foi um passe do Carlos Xavier, eu isolo-me e entre o meio-campo e a grande área faço um chapéu ao Jorge Martins, guarda-redes do Vitória de Setúbal”. Texto: André Cruz Martins Foto: César Santos