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Histórias do ‘capitão brasileiro’

Por sporting
28 Abr, 2013

Vagner representou o nosso Clube durante quatro anos e fez parte da mítica equipa da época de 1973/74.

Vagner, médio brasileiro que representou o Sporting entre 1971/72 e 1974/75, notabilizou-se por ter sido um dos primeiros capitães estrangeiros da nossa equipa de futebol. Não foram fáceis os seus primeiros tempos em Alvalade, depois de ter representado o Leixões, a Portuguesa dos Desportos e o Vitória de Setúbal. “Estava previsto que a partir da época 1971/72 fosse instituída uma regra que permitia a utilização simultânea de dois jogadores estrangeiros, mas afinal continuou a ser apenas um”, lembra. E o seu “rival” era nem mais nem menos do que… Yazalde. “Nas provas nacionais, nem podia ir um segundo estrangeiro para o banco. Já nas competições europeias, jogávamos sempre os dois”, recorda. No entanto, nessa primeira época de «leão» ao peito, Yazalde fez 13 golos em 27 jogos e estava longe do fulgor que depois viria a demonstrar. Vagner foi por isso opção em alguns jogos nacionais. “Fiz praticamente toda a caminhada até à final da Taça de Portugal [derrota com o Benfica, por 3-2] e nessa altura da temporada também era titular no campeonato. Depois, no jogo decisivo, o Mário Lino tirou-me e explicou-me porquê. Eu aceitei e continuámos a ser as mesmas pessoas, pois acatei como profissional”, explica. De resto, não esconde que Mário Lino foi um dos treinadores que mais o marcaram. “Era um homem extraordinário, que conseguia unir a equipa e era igualmente um grande sportinguista. Além, claro, dos conhecimentos técnicos e tácticos que possuía, pois já estava há muitos anos no Sporting, era um ex-jogador da selecção nacional portuguesa… Conseguiu formar um grande grupo, até ia para a sauna com os jogadores…”, revela. Mário Lino acabou por abandonar o comando técnico do Sporting de forma inesperada, no final da época de 1973/74. “Na véspera da final da Taça de Portugal, outra vez com o Benfica, estávamos em estágio em Colares. Houve um mal-entendido entre Mário Lino e o presidente João Rocha e na manhã seguinte, foi-nos comunicado que o Osvaldo Silva ia tomar conta da equipa. Felizmente, ganhámos por 2-1 no prolongamento”, lembra. Fernando Vaz é outro dos técnicos que recorda com saudade: “Já me tinha treinado no Vitória de Setúbal, aliás, foi ele quem me foi buscar à Portuguesa dos Desportos. Levou-me também para o Sporting. Era um homem que possuía grandes conhecimentos técnicos e com uma educação fantástica, fora do normal. Voltei a trabalhar com ele no fim da minha carreira, outra vez no Vitória”. Vagner foi ainda orientado por Di Stefano em 1974/75, embora como se saiba, a experiência dessa grande figura do futebol mundial em Alvalade tenha sido bastante curta. “Quando o vimos no balneário, ficámos todos em sentido! Ele veio de Espanha e apanhou uma realidade completamente diferente em Portugal. Lá, ele tinha apenas a responsabilidade de treinar. Cá, precisava de fazer tudo e pensou ‘então eu tenho de dividir os jogadores pelos quartos e outras coisas parecidas?’ Ele sentiu-se um pouco baralhado…”, defende. Vagner recorda a inesquecível odisseia que marcou o regresso da equipa do Sporting a Portugal, depois de ter defrontado o Magdeburgo, da antiga RDA, na segunda mão das meias-finais da Taça das Taças, da temporada 1973/74. “O jogo foi a 24 de Abril e no dia seguinte, quando estava marcada a viagem, soubemos através de telefonemas que tinha havido uma Revolução em Portugal. Foi muito difícil entrarmos no país… O nosso presidente João Rocha fez algumas diligências e lá conseguimos arranjar um voo de Magdeburgo para Madrid. Depois, viajámos até Badajoz de autocarro e passámos lá a noite, voltando a Lisboa no dia seguinte”, conta. “Não havia telemóveis e por isso não tínhamos a facilidade de comunicação que existe hoje em dia. A minha esposa e a do Tomé [também jogava nessa equipa do Sporting] foram-nos esperar a Lisboa, mas como nós viajámos de autocarro deste Badajoz, passámos primeiro por Setúbal, a cidade onde vivíamos”, recorda. A viagem de regresso, para além de muito longa, “ficou marcada por grande ansiedade, porque todos queriam saber o que estava a acontecer em Portugal”. Em Badajoz, o grupo dividiu-se. “Ficámos onde calhou, em várias pensões, pois praticamente não havia locais disponíveis para passarmos a noite. Depois, na manhã seguinte, houve um horário e um ponto de encontro combinado para tomarmos o pequeno-almoço. O autocarro do Sporting já estava à espera e só ficámos mais ou menos uma hora à espera da abertura da fronteira”, diz. Chegado a Portugal, o grupo revelou alguma surpresa pela forma pacífica como foi feita a Revolução: “Pensámos que teria havido alguma violência, mas felizmente tudo estava calmo e a vida desenrolou-se de forma perfeitamente normal nos dias seguintes. Treinámos e jogámos logo no domingo seguinte”. Essa temporada de 1973/74 terá sido a melhor da história do Sporting, pois culminou na conquista do Campeonato Nacional e da Taça de Portugal, para além da chegada às meias-finais da Taça dos Vencedores das Taças. “Era uma equipa extraordinária, não apenas os que jogavam, mas o plantel todo, muito bem comandado pelo Mário Lino. Todos trabalhávamos em função da equipa. Havia casos e problemas? Claro que sim, mas nunca levávamos essas situações para dentro do campo”, sublinha. Quanto aos seus antigos colegas em Alvalade, destaca Yazalde. “Não há palavra que possam definir aquele fantástico rapaz! Como pessoa, era cinco estrelas, muito amigo do seu amigo e de toda a criançada que ia ver os treinos do Sporting. Arrisco-me a dizer que ele não tinha um inimigo no futebol, mesmo entre os adversários. Ele não era quezilento, mostrava-se sempre muito leal. Mas atenção, dava tudo dentro de campo, punha a cabeça onde muitos não colocavam os pés! Era um profissional de mão-cheia!”, considera. E como futebolista “não é preciso dizer nada, todos sabem que se tratou de um goleador excepcional”. E que tipo de médio era Vagner, segundo o próprio? “Bom, vou falar mais pelo que os outros diziam… (risos) Não era um futebolista de reacções muito rápidas, mas os treinadores confiavam em mim, pois sabia ler muito bem o jogo do ponto de vista táctico e sabia colocar-me no terreno. E punha a bola onde queria, em cada dez passes falhava um. Conforme a disposição da outra equipa, ora jogava a ‘trinco’ ou um pouco mais avançado”, diz. Vagner entende que foi capitão de forma prematura. “Passei a ocupar essa função em 1973/74, numa digressão de final da época que fizemos nos Estados Unidos. Houve um problema entre o presidente João Rocha e o Vítor Damas, capitão da altura e o Osvaldo Silva, treinador que tinha acabado de substituir o Mário Lino, comunicou-me que passava a ser eu o capitão. Na época seguinte, continuei a sê-lo”, conta. Nos primeiros tempos, Vagner não se sentia confortável no cargo. “Eu disse ao Osvaldo Silva que havia jogadores há muito mais anos do que eu no Clube. Eu estava há apenas três… Mas pronto, aceitei. Na época seguinte, pensava que já não seria o capitão, mas quando estávamos no Torneio de Sevilha, Di Stefano, que era o treinador, disse-me que eu continuaria a ser. Fui ter com o Osvaldo Silva [técnico-adjunto] e ele disse-me que tinha sido decisão do presidente”, diz. Mas decididamente, Vagner não se sentia bem no cargo. Certo dia, durante um estágio, pediu para que fosse feita uma votação entre todos os jogadores: “Foi voto secreto e ganhei. Aí já não podia dizer que não queria e passei a sentir-me mais confiante como capitão”. Texto: André Cruz Martins Foto: Melissa Duarte