Diferenças que fazem a Diferença
22 Out, 2020
A introdução da tecnologia, nomeadamente a adopção do VAR, marcaram uma verdadeira revolução positiva no futebol (…) Mas como quase todas as soluções, elas trazem consigo novos desafios e necessitam de evolução
Em 1975, Muhammad Ali e Joe Frazier enfrentavam-se pela 3.ª vez no “Philippines Coliseum”*, no combate que ficaria conhecido para a história como “The Thrilla in Manila”.
Diluído pelo mediatismo do combate, reconhecido como um dos maiores eventos desportivos de que há memória e que bateu o recorde de audiência televisa de mil milhões de espectadores, ficou a polémica que envolveu a escolha do árbitro para esta luta.
O motivo é que no 2.º combate entre ambos o árbitro Tony Perez viria a ter uma grande influência na luta, primeiro ao terminar o 2.º round 20 segundos antes do tempo, prejudicando Ali, e posteriormente favorecendo este último ao não impedir a sua estratégia ilegal de clinch durante o combate. É impossível prever qual teria sido o desfecho do combate, mas certamente o desenrolar do mesmo teria sido muito diferente.
São pequenas diferenças que podem fazer uma grande diferença no desfecho final.
A introdução da tecnologia, nomeadamente a adopção do videoárbitro (VAR), marcaram uma verdadeira revolução positiva no futebol, permitindo à equipa de arbitragem o suporte da tecnologia nas decisões mais complicadas. Mas como quase todas as soluções, elas trazem consigo novos desafios e necessitam de evolução.
O caminho da verdade desportiva faz-se caminhando e o passo seguinte do VAR deveria ser a possibilidade de audição das decisões da equipa de arbitragem. É aliás um modelo já amplamente testado com sucesso no râguebi e que protege os árbitros.
Será um pequeno passo para o VAR, mas um grande passo para a transparência no futebol.
Neste caminho existem sempre os “velhos do restelo” e os apregoadores de uma “falácia ludita”, saudosos de um passado sem tecnologia. Os avanços tecnológicos trazem sempre vencedores e perdedores.
Com a audição das conversas com o VAR vence a transparência e a verdade desportiva, perde quem sempre temeu aquilo que ainda hoje, graças também ao avanço tecnológico dos motores de pesquisa de internet, se pode “escutar”, e que marca como cada uma ficará para a História.
A possibilidade de audição do VAR teria facilitado muito o entendimento das decisões do jogo do passado domingo contra o FC Porto.
Em 1976, um ano após “The Trilla in Manila”, em Portugal, o boxe do Sporting CP construía a sua História pelas melhores razões com a conquista do Campeonato Nacional com cinco títulos individuais, derrotando precisamente o FC Porto. O vencedor da categoria “Galos” foi João Miguel, conhecido como Paquito, destaque de capa da edição de hoje do Jornal Sporting, e o nosso actual treinador da modalidade no Clube.
Detentor de um registo impressionante de 245 vitórias em 250 combates e dez vezes campeão nacional, uma das “maiores tareias da sua vida” (palavras do próprio) acabaria por resultar numa das suas poucas derrotas em virtude de uma arbitragem politizada que daria a vitória ao seu adversário polaco na antiga República Democrática Alemã (RDA).
É mera coincidência do acaso, mas em 2012, no mesmo ano em que Paquito seria justamente galardoado com um prémio Stromp, é quando o documentário “Searching for Sugar Man” ganha o prémio Academy Award 2012, que conta a história do músico Sixto Díaz Rodriguez.
São duas histórias que não se cruzam, mas há duas semanas enquanto estava a mostrar o nosso multidesportivo aos donos de uma escola internacional interessados em fazer uma parceria com o Sporting CP, fomos dar a conhecer o ginásio do boxe. Tinha nesse momento terminado uma aula e apresentámos o treinador João Miguel e demos a conhecer a lenda Paquito aos visitantes (estrangeiros) que ficaram impressionados.
E a intersecção com Sixto Rodriguez está na simplicidade do homem e na grandeza da lenda. Felizmente, e ao contrário de Sugar Man, não precisamos de “procurar Paquito”. Hoje prestamos a homenagem a uma lenda viva do Sporting Clube de Portugal e do boxe português que soube defender a verde e branca nos ringues, respeitando as regras e com a dignidade do Leão que tinha ao peito.
* O Araneta Coliseum foi rebaptizado temporariamente para o efeito.
Editorial da edição n.º 3790 do Jornal Sporting