“Fomos crescendo, melhorando, aprendendo e defendendo o Clube”
01 Out, 2015
Discurso de Bruno de Carvalho na última Assembleia Geral do Sporting
A Assembleia Geral do Sporting realizada no passado domingo foi marcante. Histórica. E nem teve tanto a ver com os pontos aprovados por unanimidade, apesar de haver questões fundamentais para o Clube em discussão: após aprovação dos Associados presentes, o discurso de Bruno de Carvalho, Presidente do Clube, foi transmitido em directo na Sporting TV. “Vamos ver como isto corre, não sou uma pessoa de discursos preparados. Mas estou aqui para que os Sportinguistas sejam informados em primeira mão do que se passa”, frisou ainda antes da cerca de hora e meia de uso da palavra. “Às vezes há frases retiradas do contexto e que fazem toda a diferença”, explicou. Numa fase importante da temporada e da própria vida ‘leonina’, num ano que se espera de mais e maiores conquistas, o líder ‘leonino’ quis abordar várias questões e temas do Universo Sportinguista para esclarecer os Sócios e adeptos.
As regras de jogo só para o Sporting
Numa espécie de prolongamento do que já tinha referido na véspera, após o nulo frente ao Boavista no Bessa, Bruno de Carvalho falou da polémica arbitragem de Artur Soares Dias na sexta jornada do Campeonato Nacional da I Liga mas, reforçando a tristeza por não ter chegado à liderança isolada da prova, não deixou de assumir as responsabilidades e relembrar um facto que não deve passar ao lado: o Sporting está em primeiro lugar.
“Quero agradecer a todos os Sportinguistas que foram ao Bessa e nos fizeram sentir em casa. Ao mesmo tempo, não posso deixar de lamentar o uso de pirotecnia que se verificou: são multas avultadíssimas para o Clube e não me parece que seja necessário, isso porque os cachecóis, as bandeiras e os cânticos fazem com que estejamos em casa. Sempre que se faz isso, prejudica-se o Sporting. O sentimento partilhado era mútuo, estávamos todos tristes porque esperávamos ser líderes isolados. Não deixamos de assumir o nosso trabalho: como disse o nosso treinador no final, faltou criatividade, quem entrou não deu a dinâmica pretendida, não há desculpas. Mas há algo que não nos podemos esquecer, porque não podemos andar sempre entre a euforia e a depressão: estamos em primeiro lugar do Campeonato. Não é uma corrida de 100 metros, é uma maratona. Temos de sofrer, ser mais fortes e fazer triplamente melhor porque os erros são uma constante sempre para o nosso lado”, começou por destacar. “É importante transmitir as novas regras e leis: bola no braço de um adversário do Sporting não é ‘penalty’. Não vale a pena, as pessoas do futebol assim entenderam. Agarrar jogadores do Sporting na área não é ‘penalty’, são mimos e afectos. A lei do fora-de-jogo para o Sporting é dúbia, é só a favor do atacante menos para nós. Antes de cada jogo há uma reunião preparatória com muitas pessoas – já tinha depreendido isso mas no Bessa confirmei que não vale a pena estar nelas. Toda aquela conversa não vale nada. Fui expulso por dizer que, para quem não queria ser notado, notou-se até demais. É o futebol que temos. O Sporting venceu a Supertaça; não entrou na fase de grupos da Liga dos Campeões por razões que toda a gente conhece; está nos grupos da Liga Europa e, no Campeonato, vai em primeiro ‘ex aqueo’ com o FC Porto”.
A existência de um ‘governo-sombra’
Outro dos pontos abordados pelo Presidente teve a ver com a existência de um ‘governo-sombra’ formado por meia dúzia (neste caso literalmente) de Sócios que, através das redes sociais e escudados em teclados, vai minimizando os sucessos e fomentando a descrença, a desconfiança e a desinformação, algo paradoxal por ocorrer numa altura onde se nota uma acalmia e uma união indispensáveis para conduzir o Sporting ao sucesso. Sobretudo porque, num ponto muitas vezes ‘esquecido’, deve sempre recordar-se aquilo que era o Clube há dois anos, onde se encontra hoje e para onde se está a projectar no futuro.
“Quando começámos, o Sporting era o Clube dos três ‘grandes’ com a dívida maior; hoje já é o Clube com a dívida menor e, este ano, reconhecem o plantel do Sporting como o mais valioso dos três grandes. É fácil poluir a comunicação social porque o Facebook e as redes sociais têm uma importância preponderante no século em que vivemos. Quando ganhamos, não teclam nada; quando perdemos, há seis indivíduos que aparecem logo. Muito mais grave do que os meus rivais é saber de tudo o que se passa. Nunca vi um Sporting tão sereno e unido para conseguir um Clube diferente e ganhador. O Sporting está a mudar, paulatinamente a crescer, e deve ter nos seus adeptos e Associados o ‘12.º jogador’. Saber que existem Sportinguistas que se regozijam com as derrotas do Sporting, que até as querem, que rezam para que o Sporting perca com a Doyen, que querem que o buraco do Pavilhão desabe... Há um ‘governo-sombra’ de seis pessoas que têm conselheiros nos perfis falsos e que anseiam para que tudo corra mal. Estou 100% disponível para que saiam detrás do teclado, venham até aqui, digam as suas ideias e se candidatem”, começou por salientar Bruno de Carvalho, antes de elencar as razões que levam a esse sentimento contraditório e alertar para a importância de irradicação dessas tendências em nome da coesão de toda a família ‘leonina’. “Não vou continuar a permitir que existam Sportinguistas a desejar mal ao Clube porque não participaram no projecto do Pavilhão, porque a mulher não veio para cá, porque saíram de cá, porque pensavam que eu era um partido político e isto depois seria o ‘jobs for the boys’, porque sim, porque não. Essa panóplia de ‘governo-sombra’ vai poluindo o Universo Sporting e afrontando todos os dias o Clube. Há páginas com símbolos do Sporting feitas por benfiquistas de comum acordo com eles e partilham páginas de blogues do Benfica porque dizem mal do Presidente. Quando olhamos para o que aconteceu e para os Sócios que pedem para destituir pessoas de Associados, o que fazer a quem deseja o nosso mal e faz parcerias com os nossos rivais? Algumas das fontes que a comunicação social usa são essas mesmas seis pessoas”.
Os ‘Nenucos’ e os mitos
Alimentar os adversários é colocar entraves num caminho que se quer de maior glória, de mais títulos e uma legitimação crescente do Sporting enquanto maior potência desportiva que já é. Até porque, dentro das limitações inerentes a quem não sabe mais mas faz que sabe, os obstáculos estão identificados sob a forma de bonecos que dizem o que outros pensam para prejudicar o Clube. O Presidente ‘verde e branco’ abordou também alguns casos em específico do futebol muito falados nas últimas semanas como as tentativas de contratação de Zivkovic, Danilo, Mitroglou ou Cervi.
“Que se acabe com o mito de Álvaro Sobrinho: é um grande Sportinguista que colocou 20 milhões com a anterior Direcção para não irmos à falência e, agora, só passou a dívida a capital. Tudo o que temos estado a construir para o Clube é com muito trabalho e sacrifício. O centro dos problemas começa sempre nas tais páginas de ‘apoio’ ao Sporting. São detractores que às vezes não querem saber ler. Disse que o Zivkovic, apesar de termos desmentido qualquer interesse ou até a presença de alguém na Sérvia, estava mais perto de Carnide do que de Alvalade. Só errei porque disse Alvalade e devia ter dito Lumiar. Não tenho problema nenhum em dizer o nome Benfica por duas razões: primeiro porque é de facto uma grande instituição; depois porque a maior parte dos seus comentadores televisivos são a minha única fonte de alegria semanal. Rio e bem! Faz-me lembrar uns Nenucos gordos que dava às minhas filhas e diziam ‘Papá, mamã, papá, mamã’. Parecia tudo verdade mas não deixava de ser um Nenuco gordo com uma bateria a debitar o que lhe diziam”, salientou antes de, quase no final da intervenção, desfazer de novo outro mito que acaba por ter influência em negociações com ‘sponsors’, por exemplo: “Nós somos mais de três milhões, quase 3,5 milhões. Há algo que me irrita que é os Sportinguistas caírem o mito da treta que o Benfica são seis milhões. Não são seis, não são 14: são 4,5 e temos de deixar cair o mito. Viu-se agora que temos quase os mesmos Sócios”.
A conversa sobre o rival flectiu depois para a explicação dos alegados falhanços no mercado: “Mitroglou? Relembro o que o nosso treinador referiu e bem: se o quiséssemos já o tínhamos há muito tempo. O Sporting preferiu o Teo (Gutiérrez) e renovar com o Slimani. Sou muito lento a negociar? Ainda são muito meninos, as coisas não se fazem à pressa e quando não se tem dinheiro pior ainda. Cervi? Parece que o Sporting apresentou seis milhões e que o negócio se fez por 4,8 milhões. Com isso percebi mais sobre matemática revertida: o futebol é o único negócio onde interessa quem dá menos. Danilo esteve no Sporting? Fiquei furioso porque esteve cá e ninguém me disse... Fez-se um contrato rápido por 4,5 milhões, fechámos o acordo com o jogador em 24 ou 48 horas e aconteceu a matemática revertida, fez-se o negócio por quatro milhões com outro clube. O Sporting não podia fazer mais nada. A nossa contabilidade é isenta e limpa, só temos computadores, pessoas e folhas, não temos sacos. É por isso que estamos onde estamos. Dou-me bem com 99% dos agentes mas não me dou com os que fazem mal ao Sporting. Os euros são iguais a Norte e a Sul mas julgava que não. Mas também sabemos hoje que a prostituição, os que se vendem por dinheiro, é igual no continente e nas ilhas”.
Sempre com os pés bem assentes na terra
Apesar da recuperação, é importante manter bem ciente de que não há milagres, poções mágicas ou poços de petróleo para a retoma. Há trabalho, rigor, empenho e, sobretudo, uma intransigente defesa dos interesses do Clube que também tem um custo.
“Na SAD apresentámos 19 milhões de lucro. Quando chegámos ao Sporting, tinha havido um resultado de 100 milhões negativos em dois anos. Conseguimos que só houvesse multa suspensa por causa do ‘fair-play’ financeiro mas com todo o trabalho isso acabou, não há penas suspensas nem problemas com as inscrições. Mas temos de continuar a ser muito realistas, não descobrimos petróleo. Há deputados e eurodeputados que se preocupam mais com o Sporting mas tenham muito cuidado com o que fazem – quem se meter com o Sporting vai estar a meter-se com mais de três milhões de inimigos. Há vários mitos para acabar e outro é o do contrato estrondoso de patrocínio do Benfica. Se é um número tão grande, teria de ser comunicado à CMVM. Para isso, o Sporting podia ter assinado vários, mas continuamos a lutar a bem do Clube”, frisou antes de recordar a factura de algumas batalhas que teve necessidade de travar: “Éramos tão atacados de estar a destruir toda a formação e as modalidades e agora que ganhamos... nada. Fizemos um trabalho com conta, peso e medida. As contratações teriam sido feitas antes se tivéssemos condições. Fomos crescendo, melhorando, aprendendo e defendendo sempre o Sporting Clube de Portugal. Acreditem que é tão fácil ser-se amigo de alguns agentes e ter contas ‘off-shores’ a ficarem maiores. Até me poupava, era amigo. Sou o mesmo Bruno de Carvalho que sempre disse que ia defender o Sporting, o meu grande amor, mas protejam-me porque senão vão dar cabo de mim! Só vale a pena se me protegerem enquanto eu protejo o Sporting. Aquilo que o vosso Presidente fez foi destruir qualquer oportunidade futura de trabalhar em Portugal por lutar pelo Clube. Podia ser o tipo mais mediático e popular do País mas optei por ser o Presidente pelo Sporting Clube de Portugal e enfrentar tudo. Se estes dirigentes do Sporting não tivessem aparecido já não havia Sporting. Espero que um dia sejam os próprios Sportinguistas a reconhecer que as pessoas têm de ser profissionais. Não é só amor e carinho, estamos num outro século”.
O que se votou na Assembleia Geral?
Entrando concretamente nos pontos em discussão na Assembleia Geral de domingo à tarde, o Presidente ‘verde e branco’ explicou de forma detalhada as razões para o aumento do empréstimo, ao mesmo tempo que reforçou a ideia de que não terá qualquer impacto no plano projectado.
“Não é por termos estes resultados que de repente há dinheiro para todas as modalidades, foi necessária uma gestão cuidada porque havia dívidas para serem pagas. Já fizemos um maior investimento mas não entremos em roda viva, estamos no positivo mas precisamos de mais Sócios e mais empenho. Os bancos nunca quiseram o Pavilhão e não davam um cêntimo para isso. Fizemos o Pavilhão porque trabalhámos. A dívida não altera nada a reestruturação financeira, apesar de poder ter sido apresentada antes. Tem tudo a ver com os assuntos que nos apareceram no fim da reestruturação ao género de pipocas: foi a Nova Expressão, porque havia os tribunais; os swaps de que tanto se fala e que tinham juros para pagar; e os juros enquanto era negociada a reestruturação. Houve um aumento de nove milhões de endividamento mas não altera o nosso programa”.
A hipocrisia e a visão empresarial
No culminar de mais uma promessa eleitoral, que passava pela realização de uma auditoria de gestão ao passado do Sporting, Bruno de Carvalho fez uma análise à síntese dos resultados e às razões que levaram o Clube ao ponto a que chegou em 2013.
“Acabámos a auditoria, vão ouvir os resultados e a promessa está cumprida. Não particularizando nada, tenho de fazer um resumo muito pessoal. O Sporting sofreu desde logo de uma forte hipocrisia porque disseram que queriam deixar de ser amadores, dotar o Clube de infra-estruturas, ganhar mas houve logo um problema porque toda a solução empresarial foi montada sem qualquer ligação ao que representa um clube desportivo. Foi tudo muito matemático. Era o futebol e uma espécie de Holmes Place com a chancela Sporting no Multidesportivo tendo as modalidades que dão ainda algum dinheiro. A evolução foi fácil – vendas de património e soluções financeiras sempre em benefício da SAD e em prejuízo do Clube. E essa evolução foi terrível mas dava-se carta branca a tudo e nós lá íamos mais para o buraco até aparecer esta Direcção. Houve a falta de sucesso desportivo e tudo de uma forma muito estranha, pouco transparente, com o sentimento de que era uma chatice as assembleias gerais. Agora que os Sócios têm o poder todo, o Sporting está a crescer e quando tentaram tirar isso estava a cair. Esse tempo dava para fazer um manual de não gestão”.
A Doyen, o Pavilhão e o multidesportivo
Costuma dizer-se que o melhor fica sempre guardado para o fim e Bruno de Carvalho fez questão de terminar assegurando que o Pavilhão será não só uma realidade, como já está inclusivamente pago. Além disso, as obras no Multidesportivo arrancam no próximo mês. E só isso enche de orgulho o Presidente ‘leonino’.
“No caso com a Doyen, o Sporting tem toda a razão mas não fazemos a mínima ideia da decisão. Aquilo que sabemos é que se houver justiça, ganhamos; se perdermos, pode ser pouco ou tudo e a SAD vai recorrer para os tribunais civis, apesar de poder ter de pagar primeiro e só reclamar depois, como nas finanças. Ainda assim, fomos a primeira Direcção que não teve medo de tirar à SAD para dar ao Clube e ninguém se devia esquecer disso. Não gastámos, não deitámos fora e tudo isto que vai nascer não tem preço. A SAD arranjará soluções mas ninguém tira ao Clube o que perdeu e agora voltou a ganhar. Escusam de esfregar as mãos se perdermos com a Doyen porque aquele Pavilhão que não ia sair do buraco está pago. Está pago! Será nosso, em Março de 2017. Aconteça o que acontecer, esteja o Bruno, o António, o Luís ou a Maria, vai ser feito e está pago. E a mim o que me interessa é o orgulho por isso, enquanto os outros andavam com fantochadas de maquetes. Mas peço que terminem a Missão Pavilhão, e confiamos nisso, porque vamos iniciar no próximo mês as obras no Multidesportivo, onde nunca ninguém gastou um cêntimo. É um investimento de fundo mas se não vierem muito mais Sócios, se não formos mais do que 120 mil, depois é escolher entre obras ou equipas a vencer porque tudo se trata de afectação de recursos”, rematou.